Segurança das aeronaves da década de 70 e 80 - Parte 1

Quem está pesquisando as opções de aviões à venda frequentemente se depara com um grande volume de opções fabricadas entre 1970 e o final da década de 1980. Curiosamente, poucas opções dos 90 e 2000 estão disponíveis. No entanto, variando consideravelmente o valor do investimento e opções disponíveis, o volume aviões à venda fabricados após 2005 volta a crescer, trazendo os modelos tradicionais, porém atualizados e também opções de aeronaves de conceito mais moderno e inovador.

Por que há tantas aeronaves das décadas de 70 e 80 no mercado?

O constante crescimento da economia norte-americana no pós segunda guerra mundial, aliado aos grandes investimentos do governo no desenvolvimento da aviação, fez com que a indústria aeronáutica dos Estados Unidos ditasse o ritmo do desenvolvimento tecnológico deste mercado.

Modelos consagrados como o Beechcraft Bonanza e o Cessna 172 tiveram seus protótipos desenvolvidos ao longo da década de 50, tendo seus primeiros exemplares entregues ao público nos anos 50 e 60. Estas aeronaves trouxeram inovações conceituais que tornaram o sonho de voar acessível a pessoas comuns, deixando de exigir a perícia que anteriormente era exclusiva de pilotos com experiência e muita disponibilidade para aprender a pilotar.

Melhorias como trem-de-pouso triciclo e modernos instrumentos de navegação, tornaram a arte de pilotar uma aeronave tão simples quanto conduzir um automóvel. Aos poucos, executivos, médicos e fazendeiros que realizavam longos deslocamentos em rodovias, passaram a adquirir monomotores para estas viagens e o mercado foi adaptando as aeronaves para atender a este segmento, até então não existente no mercado.

Ao longo da década de 60 e 70, os fabricantes investiram bastante em formas de tornar a aviação executiva tão confortável, prática e simples quanto dirigir e manter um automóvel. A Cessna, inclusive chegou a criar um vídeo promocional de sua aeronave Cessna 172, comparando uma viagem de avião com o mesmo percurso em um sedan luxuoso da época.

À medida que o mercado se adaptava às necessidades do público, os fabricantes se apressavam a criar novas opções e famílias de aeronaves, como o 182 Skylane, 206 Station Air, Piper Cherokee, Bonanza A36 e variantes que buscavam manter as mesmas características de voo, porém com versatilidade direcionada à públicos mais exigentes.

Durante os anos 70 e 80, os Estados Unidos chegaram a produzir 18.000 aviões deste perfil anualmente e seu maior mercado exterior, era o Brasileiro. As dimensões continentais de nosso país, aliadas à precariedade das estradas no período e expansão do desenvolvimento no norte e centro-oeste do país, demandavam um grande volume de aeronaves para o transporte de materiais e mão de obra à estes remotos destinos.

Acredita-se que mais de 5.000 aeronaves tenham sido importadas na década de 70, tornado a frota de aviões executivos do Brasil uma das maiores do mundo. Fazendeiros e empresários se destacavam entre os clientes dos fabricantes, importando frequentemente aeronaves novas, que eram trazidas voando através da América Central e entravam no Brasil pela fronteira nos estados do norte.

Com a prosperidade das operações minerais nos estados do Amazonas e Pará, um estrondoso número de pilotos e aeronaves se dirigiram aos dois estados com a intenção de firmar contratos de fretamento, que transportassem pessoas e equipamentos aos garimpos. Frequentemente este era o único meio de acesso às instalações, fomentando o desenvolvimento da aviação local rapidamente.

Cidades como Itaituba e Crepuri chegaram a registrar movimentos de pousos e decolagens superiores aos aeroportos internacionais de São Paulo e do Rio de Janeiro, tamanha a movimentação de pequenas aeronaves entre o nascer e por-do-sol.

Aeroporto de Itaituba

Mudanças na legislação das operações de extração fizeram com que este mercado perdesse o fôlego, rapidamente desmobilizando o grande aparato de aeronaves alocada em suas precárias pistas. Com o passar do tempo, estas aeronaves foram sendo re-distribuídas ao longo do país e cumprindo missões diversas, como transporte de malotes de empresas, aero-fotografia e taxi-aéreo.

Instabilidades no mercado americano no final da década de 80 fizeram com que grandes fabricantes como Cessna, Piper e Beechcraft reduzissem ou até mesmo interrompessem a fabricação de pequenas aeronaves monomotoras a pistão. Os expressivos números apresentados em 1976 (18.000 unidades/ano), caíram para 4.000 em 1986 e 928 em 1994.

Sucateamento da frota americana

A popularização da aviação geral trouxe problemas inesperados, como o sucateamento de aeronaves, uma vez que o tempo de vida útil delas estava superando e muito, o dos automóveis. Até aquela época, os controles de manutenção eram precários e aeronaves da década de 40 e 50 operavam por todo o país, expondo ao risco os passageiros e tripulantes.

O governo americano determinou regras de responsabilidade sobre os novos produtos que acabaram por inviabilizar a produção, elevando o custo a níveis que tornariam as aeronaves inacessíveis. Estas regras foram aplicadas pelo governo em função do crescente número de acidentes e ações contra os fabricantes.

A Cessna, maior fabricante de pequenas aeronaves da época, tentou administrar a baixa demanda do início dos anos 80, porém após ser incorporada pela General Dynamics, em setembro de 1985, encerrou sua produção de monomotores leves.

Da mesma forma, a Piper, que já vinha passando por problemas financeiros que a levaram a mudar de nome algumas vezes, encerrou a produção de modelos famosos como o Super Cubro-Me e o Cherokee Six / Saratoga, que tinham público cativo no mercado mundial.

Em contra-partida, a Beechcraft, recém adquirida pela Raytheon, optou por encerrar a produção de outras aeronaves anteriores, mantendo o foco em seus modelos chave: Beechcraft Bonanza e Baron. Além disso, a aquisição direcionou as pesquisas e desenvolvimento de novos produtos no segmento dos jatos e turbo-hélices que impulsionaram o King Air, aeronave de segmento diferente dos monomotores.

Lobby e a “Lei de revitalização da aviação geral” (General Aviation Revitalization Act)

Buscando uma solução para o impasse da aviação leve, o então presidente da Cessna, Russ Meyer, articulou um movimento de nome GARA (General Aviation Revitalization Act). Composto por empresários do segmento, este grupo buscava determinar os limites de responsabilidades dos fabricantes sobre os produtos, viabilizando a produção e venda destas aeronaves.

De forma resumida, esta lei isentava os fabricantes de responsabilidades sobre seus produtos produzidos há mais de 18 anos no momento de um eventual acidente.

Em 1994, o projeto é aprovado pelo presidente Bill Clinton e os fabricantes se mobilizam para retornar a produção, porém agora, atentos à produção prioritária dos modelos com baixo índice de acidentes nos anos anteriores.

A Cessna, retornou à produção dos modelos 172, 182 e 206. Mesmo com problemas financeiros, a Piper não havia interrompido completamente sua produção, portanto continuou com os modelos PA32 (Cherokee Six / Saratoga) e Seneca. A Beechcraft, já com o nome Raytheon Aircraft também manteve a produção do Bonanza e Baron.

Como as leis de responsabilidades não foram aplicadas no Brasil, os fabricantes locais puderam aproveitar a escassez de oferta e aliado à Lei da Reserva, aumentaram as vendas de aeronaves no segmento.

Surgimento da Embraer e o fortalecimento da indústria aeronáutica brasileira

Conheça na continuação desta matéria, as medidas tomadas pelo governo militar para incentivar o desenvolvimento da aviação no Brasil, durante a época de ouro da aviação geral. Clique aqui para ler a continuação.